Arquivo para categoria: Poema sobre os problemas da convivência social.

olho

O Brasil está parindo um olho.

Não é o Olho de Hórus,

Mas um olho de verme,

Nas estranhas do poder.

O Brasil está parindo um olho,

Para o esgoto vergonhosamente aparecer.

 

Então, que olho será esse,

No subterrâneo do poder?

É o terrível olho de verme,

Que, se não ferir,

A todos pode abater.

 

Olho que brota do esgoto

Do subterrâneo do querer.

O querer também tem seu esgoto,

Escondido dentro de cada ser.

 

Pois nas entranhas do poder,

Esse olho fica torto.

Às vezes quadrado,

Para impor seu querer.

 

Esse olho, infelizmente, tem poder.

Capta os súditos

Com aquele ódio do mal querer.

 

Antes que eu esqueça,

Preste atenção.

O Brasil está parindo um olho.

Filho da puta de um olho,

Que não é rei.

 

Este palavrão, por favor, me perdoe.

Mas, infelizmente, não vai assustar este olho,

Que se acha rei.

 

Como eu sei?

Olhando para Brasília.

Se os ventos pararem,

Poderá ocorrer o parto

Do olho que se acha rei.

 

Porém os ventos não podem parar,

Porque uma pátria tem seus olhos.

Um país, sem cumprimento das leis,

Coloca o subterrâneo, para acontecer.

 

O Brasil está parindo um olho,

Nas entranhas do poder.

Um olho ou um monstro.

Aliás, uma incrível besta,

Que, se nascer,

Pode fazer a grande nação,

Em unidade, se perder.

 

Brasília, DF, em 03 de julho de 2020.

O Brasil está parindo um olho. Poema de Flavio di Fiorentina.

ave de rapina

Uma ave de rapina em meu quintal.

De novo aquela ave de rapina.

Exuberante animal da campina.

Tem preferido o pináculo da casa vizinha,

Para avistar meu quintal.

 

Vai embora, ave de rapina!

Vai embora, Carcará!

Aqui é o meu quintal.

 

Por que eu precisaria de mais um vizinho?

Meus vizinhos são o ronco dos motores,

O barulho intenso das festas,

Que vem das casas vizinhas.

Um oi, bom dia ou boa noite,

Constante e repetitivo,

Quando se cruza na rua.

 

Esses são meus vizinhos.

Distantes como os planetas.

Mas têm seu dia de reencontro.

Por exemplo, quando um muro vizinho cai.

 

Então vai embora, ave de rapina!

Vai embora, Carcará!

Não venha pegar as minhas galinhas,

Para levá-las para o seu ninho.

 

Contato que volte e passei no meu quintal,

Pode pegar minhas galinhas,

Por dias, anos e noites.

 

Porém tem que sair do pináculo da casa vizinha,

Para deixar de espiar meu quintal.

Melhor ave de rapina do que um drone espião sobrevoando o quintal.

 

Brasília, 21 de abril de 2019.

Carcará, uma ave de rapina em meu quintal. Poema de Bomani Flávio.

 

desigualdade social

A desigualdade social deixa o ser em parafuso.

A desigualdade social deixa o ser em parafuso,

Por causa de tudo que acontece em cima,

Em detrimento do que acontece embaixo.

Dois cenários opostos.

Na debaixo todos são iguais.

As bactérias a todos comem.

Os fungos complementam.

A carne desaparece.

Tudo, aliás, vira pó.

 

Na de cima não é bem assim.

Quando pinta a desigualdade social,

Mesmo que por uma vírgula,

O ser entra em parafuso.

 

Talvez seja por isso que meu ser entrou em parafuso,

Ao andar na rua cheia de carrões.

Bairros com casas lindas de doer os olhos.

De pouca gente na rua,

E eu andando naquela rua,

Com pouca grana no bolso,

À procura de emprego.

 

Como se eu fosse um verme,

Um Zé ninguém,

Em um mundo de aparente charme.

 

Quando o ser entra em parafuso,

Muitas asneiras saem da boca.

Como se o direito estivesse precluso.

 

Então meu ser bêbado disse para o outro meu ser sóbrio:

Debaixo da terra todos são iguais.

Acima da terra todos são desiguais.

 

Partido de cima com critérios de regalias.

Partido de baixo ninguém tem regalias.

Que extremo juízo de valor,

Para quem se acha em parafuso!

 

De tanto esmorecer no discurso do parafuso,

Meu ser sóbrio foi para casa.

Eu fiquei parafusando na rua.

Como a desigualdade social não desparafusa o ser!

 

 

Brasília, 06 de fevereiro de 2019.

A desigualdade social deixa o ser em parafuso.

A intolerância ofende a imagem do Criador.

A intolerância ofende a imagem do Criador,

Não importa a genética do agressor,

Que precisa dos olhos e da boca,

Para dizer que a vítima não tem nenhum valor.

 

O agressor valoriza muito a indiferença,

Licença que não tem nenhum valor.

Quanto mais o ser se torna intolerante,

Mais distante fica do Criador,

Que criou o homem à sua imagem e semelhança.

 

Se o agressor valoriza tanto a cor da pele,

O Criador, na criação, não indicou a cor.

Simplesmente criou homem a sua imagem e semelhança.

O Criador olha o homem de dentro para fora,

Não de fora para dentro.

 

Patrimônio que o agressor ignora,

Que olha a vítima de cima para baixo,

Com sinal de reprovação.

Esse raio X vulgar não tem nada de ciência.

Mas revela que o destino de todos é um só:

O cemitério de qualquer cidade,

Onde os desiguais serão vizinhos e iguais.

 

Etnia suprema na natureza há apenas uma:

O homem a imagem e semelhança do Criador.

Quando isso se rompe, cria-se a etnia do terror.

 

Isso se estende a toda forma de intolerância.

Machismo,

Racismo,

Preconceito contra pessoa LGBT,

Intolerância religiosa,

Intolerância contra pessoa com deficiência,

Intolerância contra estrangeiros,

Intolerância racial.

São tantas intolerâncias que se criariam o Livro das Intolerâncias.

Infelizmente, seria o livro do mal.

 

Assim, por causa da intolerância,

Quantas pessoas foram mortas,

Em nome da supremacia da cor.

 

Fato que levou a tantas guerras e traições.

Muitas culturas se apropriaram de outras.

Muitos povos foram subjugados.

Uns tornaram-se vencedores.

Outros escravos da própria sorte.

Alguns tiveram que refazer a vida em outros lugares,

Sujeitando-se a climas tão adversos,

Que mudaram a genética,

Que mudou a cor.

Mas tudo isso mudou a imagem e a semelhança do homem?

O próprio Criador escolheu a imagem e semelhança,

Como referencial para qualquer ser.

 

E o que sobrou depois de muitas intolerâncias?

Para os ricos, terras e riquezas.

Aos derrotados, a intolerância invisível de nossos dias.

 

Ódio contra ciganos,

Ódio contra negros,

Ódio contra judeus.

Ódio contra pobres.

E por que há tanto ódio?

 

Porque confundem a imagem do Criador,

Que não disse a sua cor.

A intolerância ofende a imagem do Criador,

Que não disse a sua cor.

 

Ninguém, na verdade, devia dizer a sua cor.

Caso qualquer documento exigisse,

A cor universal seria imagem e semelhança do Criador.

 

Brasília, DF, em 16 de outubro de 2018.

A intolerância ofende a imagem do Criador. Poema de Bomani Flávio.

mundo de muros

Muros que separam a sociedade.

Muros que separam a sociedade.

Muros que são mundo de muros.

Muitas histórias para contar.

Mas o que sobraram,

Para tão visíveis fronteiras?

 

Políticas de resistência.

Extrema resistência,

De pesadelo a superar.

 

Muros que, na verdade, dividem o mundo.

Muro na Cisjordânia.

Muro do México.

Muros de Ceuta e Melilla.

Muro do Chipre.

Muro da Vergonha de Lima.

Extensa lista de muros,

Que resume o pão.

 

Há, pois, o muro e, por detrás, o pão.

Todos, por conseguinte, querem pedaço de pão.

Sem o pão, pois, ninguém vive, veste ou brinca.

 

Pedaço na mesma proporção,

Igual para todos.

No início do mundo talvez fosse assim.

Nos dias atuais não é bem assim.

Todos querem pedaço de pão.

Mata-se pelo pão.

Esnoba-se pelo pão.

Essência que resume o problema: muro e pão.

Nos muros que separam a sociedade,

Há muitos mundos dentro dos muros.

Mas é nesse mundo de muros que vivo e sobrevivo.

Talvez uma nova Torre de Babel reunifique o pão.

Na mesma proporção.

Partes iguais para todos.

O grande problema já não estará nos muros,

Mas no pequeno, muito pequeno, coração,

Que gosta demasiadamente de sonhar.

 

Brasília, DF, Brasil, em 03 de junho de 2018.

Muros que separam a sociedade. Poema de Bomani Flávio.

refugiados

Refugiados e o sonho da terra prometida.

São os refugiados.

Naquela extensa planície,

Que vira montanha,

Que vira deserto,

Resta apenas caminhar.

Cada passo uma estória,

Cada dia uma fome vencida,

Para a morte afastar.

 

Para quem é refugiado,

Só resta ser aliciado,

Por sonho de um mundo melhor.

 

Guerra,

Ambição,

Perseguição.

Inimigos da pátria.

Inimigos do ser.

Fardos da carniça,

Que ficam para trás.

 

O destino é a terra prometida,

Na outra margem do mar.

Às vezes pode ser o deserto,

Além das montanhas,

De qualquer lugar.

 

Mas na travessia do mar,

O barco sobe e desce,

Em íngremes ondas,

Como se estivesse a surfar.

 

O surfar, porém, não é lazer.

Ninguém ali está para brincar.

A luta é para sobreviver,

Em jornada de muitos amanhecer.

 

E há homens,

Crianças,

Velhos.

Juntos como sardinha na lata.

Alguns são tragados.

Outros resistem.

 

Mas têm que chegar.

Têm que chegar,

Do lado de lá.

Se há uma terra prometida,

Deve estar do lado de lá.

 

São muitas terras prometidas,

Tantas bandeiras diferentes,

Que, a princípio, repudiam quem chegam lá.

 

Para quem é refugiado,

Rejeição tem que superar.

Há constante deserto no caminho.

Sol de lascar a pele.

O protetor é o próprio suor.

Filho no colo, nas costas ou à tiracolo.

Importante é chegar.

 

Ódio, desemprego, mortes, doenças.

São muitos os fantasmas,

Não importa se noite ou dia,

Que chegam a assustar.

 

Seja no caminho,

Seja na própria terra prometida,

Isso pouco importa.

Se a pátria nada vale,

Para a origem não quer voltar.

 

Importa olhar para frente.

Para superar o grande mar,

Que na terra prometida chegará.

Se desistir ou perder,

Em estátua de pedra provavelmente se tornará.

Inútil pedra que,

No deserto ou dentro do mar,

Nada significará.

 

Brasília, DF, Brasil, em 14 de maio de 2018.

Refugidos e o sonho da terra prometida. Poema de ‎Bomani Flávio.