O mundo foi criado por desejos.
De desejos eu nasci.
Sou formado por desejos,
Criaturas visíveis e de carne e osso,
Escondidos sob o casaco de pele,
Que me cobre todos os dias.
A pele está por fora.
À vista dos olhos, é uma.
As criaturas estão por dentro,
Escondidas sob o casaco de pele,
Que me cobre todos os dias.
São milhares de milhares,
Encravados na terra fértil,
Extremamente fértil e oculta,
Do interior do ser do meu ser.
Assim, se o homem veio da terra,
Da terra também vem os desejos.
Terra fértil, bem fértil,
Onde se produzem os desejos,
Lá dentro do ser do meu ser.
Terra fértil, por sinal, que mal conheço.
Se fosse terra estéril,
Domaria facilmente esses bichinhos de carne e osso,
Escondidos sob o casaco de pele,
Que me cobre todos os dias.
Terra fértil que brota alegria.
Terra fértil que brota a tristeza.
Às vezes brotam flores de espécies estranhas,
Que exalam ansiedade sobre ansiedade.
Outras vezes exalam depressão.
Isso durante dias, semanas ou anos,
Para bagunçar o ser do meu ser.
São tantos desejos, milhares de milhares.
Andam por toda a parte do meu ser,
Escondidos sob o casaco da pele,
Que me cobre todos os dias.
Aquelas espécies que assustam sobremaneira o ser.
Vão e voltam,
A depender do querer,
Que muitas das vezes não controlo.
Desejos dominantes versus desejos dominados.
Que receita vou usar,
Para lidar com cada um todos os dias?
Talvez seja por isso que eu seja assim,
Vulnerável como uma formiga,
Com aquela imensa folha nas costas,Na calçada de tanta gente.
Bom seria que a terra fosse desértica.
Todo mundo pensaria,
Após pensar demais,
Qual caminho pegaria.
O mundo foi criado por desejos.
De desejos eu nasci.
Tudo nasce por causa dos desejos.
Sem desejos ninguém vive,
Nem você nasceria.
Desse modo, se eu errar,
Quem paga será a pele,
Não os desejos,
Criaturas visíveis e de carne e osso,
Escondidos sob o casaco da pele,
Que me cobre todos os dias.
Como domá-los?
Despertam como vulcões para bagunçar o ser do meu ser!
Vulcão ativo atormenta,
Mas muitos vulcões ativos e próximos desorientam a bússola.
Aquela que tem no ser.
Preciso, pois, domar os bichos selvagens,
Que assombram o ser do meu ser.
Por ora, melhor fechar os olhos por instantes.
Pensar que sou um.
Um só nome.
Uma só pessoa.
Sensação que acaba quando abro os olhos.
Os desejos são milhares de milhares.
Às vezes se comportam como anjos ou demônios,
Escondidos sob o casaco de pele,
Que me cobre todos os dias.
Que receita vou usar,
Para lidar com cada um todos os dias?
São milhares de milhares,
E eu apenas um.
Mas esse um tem que ser o chefe, manter-se chefe, de todos os dias.
Quanta responsabilidade para esse um!
Manter-me, a todo momento, íntegro e com sanidade!
Brasília, DF, Brasil, em 08 de julho de 2018.
Desejos escondidos sob o casado da pele. Poema de Bomani Flávio.