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lobisomem

Em tempos de cataclismo, vire um lobisomem.

Em tempos de cataclismo,

De aterrorizar o ser, 

Vire lobisomem,

Se quiser sobreviver.

O faro do lobisomem poderá salvar você.

 

Serão tempos extremamente sombrios.

As leis estarão em desequilíbrio.

Interpretá-las com má-fé pode machucar o ser.

 

Antes que o tempo chegue,

Vire o lobo dos tempos do cataclismo.

Antecipa-se com os olhos do licantropo.

Solte a fera de dentro de você.

 

Em época adversa, tão incomum,

Do nada muita coisa surgirá.

O ser precisará de conhecimento.

Mas, se não tiver lentes potentes,

Talvez ninguém venha a socorrer.

 

Em época de cataclismo,

Torne-se um licantropo do saber.

A fera do cataclismo é mais que teoria.

A história do homem lobo é mais que alegoria.

Os olhos do licantropo serão a própria história.

 

Porém, não vire o animal da lua cheia.

Este bicho vem da diversão do cinema.

Recreio para os olhos que apenas assusta o ser.

 

Tempos de cataclismo são tempos sem conhecimento,

Que ficarão escondidos para não dar discernimento.

Em época voltada para o não saber fazer.

 

Em tempos de cataclismo, de aterrorizar o ser,

Vire o visionário, se quiser sobreviver.

Quem perder a visão, poderá desaparecer.

 

Quer ter, pois, envergadura?

Vire um lobisomem.

Tenha a força do saber.

 

Sobreviva sem morrer.

Antes tarde do que nunca,

Solte a fera de dentro de você.

 

Faça isso antes das trinta luas.

Senão viverá no mundo da lua.

Em tempos de cataclismo, de aterrorizar o ser, 

Solte o lobisomem que há dentro de você.

Caso tenha perdido a visão,

Vá para as campinas do clamor.

 

Com as mãos levantadas para os céus,

Lutará com Elohim,

Que criou as noites e os dias.

Que criou as ideias, os seres.

Lutará durante noites sem fim.

No final, Elohim abençoará você.

 

Mas não se preocupe com os cataclismos.

Preocupe-se com o protagonismo.

Se não quiser ser um lobisomem,

Não será filósofo do saber.

 

Quadrúpede contra as vacinas,

Para eliminar os pobres e os doentes,

Que se juntariam aos feios.

 

Assim, seja lobisomem contra os algoritmos.

Talvez o maior de todos os cataclismos.

Canibal da manipulação,

Talvez a fonte de todos os cataclismos.

O algoritmo a todos poderá abater.

 

Brasília, DF, em 14 de setembro de 2018.

Em tempo de cataclismo, vire um lobisomem. Poema de Bomani Flávio.

cientista

Torne-se cientista da própria vida pessoal.

Torne-se cientista da vida pessoal,

Quer dizer, cientista da própria vida pessoal,

Já que tudo gira em torno do emocional.

Quando não gira, gira em torno do sol.

Se o sol, aliás, não for o gigantesco sol de arder os olhos,

Que há dentro do coração.

 

Coração valente que suporta muita dor.

Às vezes dor de morrer a carne,

Outras vezes dor de morrer a alma.

Dor que precisa de muita observação.

 

Se a ciência começa na observação,

O ser aflito precisa de solução,

Para a devida ação.

 

Torne-se cientista da própria vida pessoal,

Antes que os primeiros socorros cheguem.

Cientista dos primeiros socorros,

Da própria vida pessoal.

 

Descubra os primeiros sintomas da ansiedade e da depressão,

Que assustam exageradamente a alma do ser.

Crescem tanto que a alma geme.

Dor do silêncio que algema.

 

Se os espectros tivessem olhos e pele,

Tudo pareceria fácil.

O ser escolheria as armas para o combate.

Na medida certa para cada combate.

 

Mas nem todo inimigo tem olhos e pele.

Mesmo assim, o ser sente, sente tanto, que chora.

Torna-se, sem saber, de dezenas de elefantes.

Para ombro que mal leva a cabeça do tronco.

Torne-se cientista da própria vida pessoal.

 

Observar-se começa com aquelas perguntas.

Indagações rotineiras que assombram a alma do ser.

Por que sou assim?

Em que minha vida pode melhorar?

Por que tantas tentativas frustradas?

Por que relacionamentos errados?

Por que a demora da prosperidade?

Por que remédios contra a ansiedade?

Por que, assim, tanta burrice?

Torne-se cientista da própria vida pessoal.

Quem não faz perguntas, não será gente.

Tornando-se cientista da própria vida pessoal,

Será, de imediato, a imediata ajuda.

 

Nesta vida tão bela e que às vezes parece ingrata,

Tudo pode girar de maneira confusa.

Quando não gira, gira em torno do sol.

Se o sol, aliás, não for o pequeno coração.

O que habita dentro da alma.

 

O cientista da vida pessoal sabe onde pisa.

Saber onde pisa diminui a ansiedade,

Esvazia ou acaba com a depressão.

A tal ponto que dezenas de elefantes podem virar a menor das formigas.

 

Brasília, DF, Brasil, em 10 de setembro de 2018.

Cientista da própria vida pessoal. Poema de Bomani Flávio.

segredo das coisas

O pássaro dos segredo das coisas.

Muita fatídica esta manhã de segunda-feira,

Que produz uma visão fantasmagórica,

Em plena luz do dia!

Um pássaro sobrevoou minha cabeça,

Abatida de tanta tristeza.

 

Esplendorosa ave grande.

Sobrevoou como se eu fosse a carniça.

Eu à procura de emprego,

A ave à procura da carniça.

 

Eu não era a carniça, disse-me.

Eu vim do mundo que faz o mundo.

Do visível ao invisível.

Do átomo às máquinas, carros, casas, apartamentos,

Roupas simples, roupas caras.

 

Vim do mundo do segredo das coisas.

O pássaro voou até meu ombro e ainda disse:

Se quiser ter carro, casa, viajar,

Casamento feliz, bons filhos, longevidade,

Descubra o segredo das coisas.

 

Descubra os segredos do universo.

Tudo tem um início.

Domine o início e venderá o produto.

Assim, tudo acontecerá.

E voou.

O pássaro voou e sumiu.

Eu estaria ficando doido?

Espécie que fala como aquela não há.

Ave de beleza e sabedoria.

 

Para meu espanto,

O pássaro voltou.

Eu conheço você.

Descubra o segredo das coisas.

O conhecimento está presente.

Agite as águas do conhecimento.

Uma coisa puxa a outra.

O pássaro voou e nunca mais voltou.

Quais são os segredos das coisas?

Quais são os segredos do universo?

 

O homem descobriu os segredos das bombas.

Quantas bombas surgiram!

Os aviões estão voando.

Os foguetes ultrapassam o céu azul.

Os computadores dominam as mãos, os olhos.

Brevemente dominará a mente.

Os remédios curam quando eficazes.

 

Tantos segredos por trás das coisas,

Que viraram produtos.

Tudo se transforma em produto.

Quem não tiver nada será.

Nem sequer tenho o emprego.

Produto que me amedronta.

 

Os carros foram embora.

As pessoas foram embora.

Senti a solidão da avenida.

Como eu queria que o pássaro voltasse!

 

Porém notei que a ave deixou uma semente,

Que caiu na calçada.

A semente da carniça.

O segredo das coisas começa na carniça.

Quanto mais o odor,

Mais perto o sucesso.

 

Brasília, DF, Brasil, em 06 de setembro de 2018.

O pássaro dos segredo das coisas. Poema de Bomani Flávio.

casal

Leis do casal queimadas no incêndio.

Leis do casal vigoraram por meses, anos.

Leis que, porém, o incêndio consumou.

Que desastre naquela tarde de domingo!

Mas o que sobraram foram as cinzas,

Abundantes cinzas,

Que, no final, não encheram a palma da mão.

 

Como aquelas labaredas de fogo,

Tão tímidas,

Destruíram tão rápido as leis do casal?

 

Incêndio, tamanho que seja, destrói quaisquer leis,

Se não forem guardas na porta e dentro do coração.

Infelizmente, uma só carne atingida,

Infelizmente, intempéries de dois corações.

 

Todo relacionamento começa com o mínimo de leis,

Para juntar uma só carne, se não forem fúteis.

Do nada e do nada a labareda surgiu.

Mas quando há desastre,

Caça-se o culpado.

Base para a trivial pergunta,

Que ressoa como o eco dos sinos da igreja.

Quando se destrói as leis do casal,

De quem será a culpa?

Culpa, culpa e culpa!

Talvez não se tenha culpado.

Talvez a culpa sejam das próprias regras.

Leis não foram feitas para serem pisadas,

Nem destruídas na raiva existente no incêndio.

 

Nunca deixe as leis serem amassadas e pisadas.

Caso contrário se transformarão em cinzas.

As leis do casal serão imunes a incêndio,

Se ficarem longe, bem longe, das malícias das miudezas.

 

Brasília, DF, Brasil, em 05 de setembro de 2018.

Leis do casal queimadas no incêndio. Poema de Bomani Flávio.

amigos

Socorro, meus amigos sumiram!

Socorro, meus amigos sumiram!

O que está acontecendo?

Meus amigos sumiram.

Agora não sei o que fazer,

Nem como devo proceder.

 

Quando os amigos desaparecem,

O quintal fica triste.

O sorriso fica nas lembranças,

E todos correndo nas fotografias.

 

Socorro, meus amigos sumiram!

Nas fotos todos estão presentes.

Mas no dia a dia a solidão sempre a abater.

 

Por que foram embora?

Isso não sei responder.

Eles foram embora.

Não deixaram recado.

Agora não sei o que fazer.

 

Amigo é patrimônio da vida.

Bem que não se deprecia.

Se for pedra bem lapidada,

A amizade, no fogo, sempre será testada.

 

Socorro, meus amigos sumiram!

Reclamação ouço de toda parte.

Minha esposa indaga onde estão meus amigos.

Ela diz que tem várias amigas.

Sou homem e não recebo visita.

Será que sou um homem parasita?

 

Socorro, meus amigos sumiram!

Agora não sei o que fazer.

Passei a vida toda tendo amigos.

Hoje resta saldo zero como nenhum.

 

Sábias, pois, são as perguntas da vida.

Contraditórias são as respostas.

Se há amigos fora do universo,

Por que também não estão dentro do universo?

 

Socorro, meus amigos sumiram!

Agora não sei o que fazer.

Busco amigo que seja da lua ou do sol,

Que esteja nas estações do querer.

 

Brasília, DF, Brasil, em 28 de agosto de 2018.

Socorro, meus amigos sumiram! Poema de Bomani Flávio.

álbum de família

Quem está ausente no álbum de família?

Quem está ausente no álbum de família?

Tanto tempo que não vejo.

Meses, anos?

Na vida moderna tão cheia de novidades,

Já não se usa o álbum de família.

O álbum de família hoje está em todos os lugares,

Menos na sala de visita.

Por que tive que olhar para o álbum,

Tão esquecido na sala de visita?

 

Álbum é coisa minúscula.

O que importa na vida é coisa graúda.

Por que o álbum de família,

Que vejo na estante esquecida,

Virou uma coisa bem graúda,

Para olhos tão seletivos?

 

Porque de lá saiu uma rã,

Tão pequena que não canso de lembrar.

Como a rã saiu de um álbum,

Agora não sei onde está.

 

Quando uma rã sai de um álbum,

Está, na verdade, resgatando o passado.

Revirar o passado tem seu valor,

Se for para reparar o bem.

 

Por que lembrar o passado,

Se o presente está indo tão bem?

Remoer o passado vira remédio,

Se o ser quer mostrar alguém.

No álbum de família que folheio,

As inesquecíveis fotos de meus pais.

As crianças brincando no quintal.

Eu, porém, na barriga de minha mãe.

 

Eu estava lá,

Sob a pele charmosa de minha mãe.

Contudo, cadê os outros personagens,

Esconderam-se por causa da falta de coragem?

 

Trata-se dos trabalhadores invisíveis,

Que criaram o ser,

Que vê estas fotos.

Onde está o espermatozoide vencedor da corrida?

Onde está o óvulo fecundado,

Que seguiu caminho triunfal para o útero de minha mãe?

 

O álbum não vai mostrar a invisibilidade.

Os seres invisíveis originam as visíveis.

Por isso que eles estavam lá,

Escondidos sob a pele de minha mãe.

 

Estavam trabalhando para esculpir o ser.

Mas eram para estar no álbum de família,

Que teria o ser do passado e o ser do presente.

Quem iria querer o espermatozoide?

Quem gostaria de ver o óvulo?

 

Todos nascem do assombroso.

Eu, meus pais, meus irmãos,

As mulheres, os homens, as crianças,

Os fisiculturistas, os modelos,

Presidentes, rainhas e princesas.

Todos nascem do assombroso,

Para dirigir o mundo.

Se nada não nascer do assombroso,

Não será deste mundo.

 

Brasília, DF, Brasil, em 22 de agosto de 2018.

Quem está ausente no álbum de família. Poema de Bomani Flávio.

corpo

Lei do corpo e do eu.

O corpo.

Tudo na vida tem um corpo,

Que funciona como embalagem.

Mas embalagem do quê?

Embalagem do milagre chamado eu.

 

Milagre por milagre,

O eu é o milagre da natureza.

Maior invenção do universo.

 

Gaba-se tanto das façanhas,

Que acha-se o tal.

Mas nunca será como Elohim,

Maior de todos os eu.

 

O eu escolhe a roupa ou se deslumbra.

Come açucarados ou quer emagrecer.

 

Mas é contraditório.

Comanda o corpo.

Às vezes o destrói.

Que luta constante!

Como se vivessem distantes!

 

Sem o corpo o eu não existe,

Mas sem o eu não é nada.

Seria um triste cadáver,

Escultura que desaparece.

 

Que coisa difícil de explicar!

O cadáver desaparecerá,

Mas onde estaria o eu para o consolar?

Quer, pois, existir?

 

Tenha um corpo.

Mas sem o eu ele não acorda.

Também não come, fode, anda, xinga, etc.

A lei do corpo e do eu.

Que mistério se tem para decifrar!

Conseguirá a indústria revitalizar o corpo que se foi?

Conseguirá trazer de volta o eu que se escondeu?

Onde estará o eu que se perdeu,

Para deixar o corpo como uma pedra?

Objeto que não fala, não sorri?

Difícil, muito difícil de explicar.

 

A lei do corpo e do eu é uma ciência.

A lei do corpo e do eu é uma religião.

Tudo muito difícil de explicar.

 

O corpo, pois, desaparece.

O eu também desaparece.

Quantos choros pelo corpo que se vai!

Quantos choros pelo eu!

 

Quase tudo desaparece na vida.

O descarte é da natureza.

Quando tudo parece complicar a mente,

Melhor tomar um vinho bem singular.

Pode também ser um comum.

Sentir cada gota atravessando o paladar.

Talvez se perceba a diferença entre o eu e o corpo.

Assim como entre o céu de cima, dos lados e de baixo.

 

 

Brasília, DF, Brasil, em 18 de agosto de 2018.

Lei do corpo e do eu. Poema de Bomani Flávio.

espólio sentimental

Espólio sentimental.

O espólio sentimental surgirá,

Se o amor não vingar.

Tão breve quanto o broto de ramo que mal cresceu,

Quem testemunhará?

 

O que comprovará a existência desse amor?

Restarão as testemunhas,

Sejam do bem,

Sejam do mal.

Entre elas, os retratos ou as fotografias.

Espólio sentimental que ficou,

De um amor que não vingou.

 

Não chore,

Não lastime,

Se o espólio sentimental foi o que restou,

De um amor que não vingou.

Poderia listar outros não,

Mas o tempo infelizmente não esperou.

 

De que adianta os retratos ou as fotografias rirem

Cliques de viagens inesquecíveis,

Abraços e beijos, alguns em público,

Evidências, pois, de uma intensa felicidade,

Se, nos dias de hoje, sobrarem apenas o resto de uma dor?

 

A felicidade pode estar nos retratos ou fotografias,

Mas a tristeza, se acolhida,

Transformar você em um ser tão abstrato,

Que xingará, a toda hora, o presente de ingrato.

Retratos ou fotografias são ideais.

 

Assim como nem toda planta vinga,

Nem todos os ideais também vingam.

Tudo parece ideal,

À primeira vista.

Tudo parecerá ideal,

Se não encher a terra,

Aquela lá dentro do ser,

Com satisfação.

Que é pois que vem?

Nada virá,

Porque tudo no passado estará.

Pilhas e pilhas de retratos.

Muitos nas nuvens,

De um amor que se foi.

 

Se os retratos ou as fotografias não encherem a terra do ser com satisfação,

Inevitavelmente aparecerá o espólio da medicação,

Com vasto acervo infelizmente da decepção.

 

Brasília, DF, Brasil, em 17 de agosto de 2018.

Espólio sentimental. Poema de Bomani Flávio.