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mapa do desapego

Mapa do desapego.

Olho suavemente para o mapa do desapego,

Que mudou a geografia do meu coração.

Sou cidadão do mundo,

Não sou da minha terra.

 

O registro de nascimento,

Para aonde vou,

Não custa um tostão.

Na matemática,

Aquilo que não vale nada.

 

No mapa do desapego,

Grande surpresa superei.

Meu coração se deslocou milagrosamente para a direita.

Vivo cem anos a mais.

A ciência se espantou,

Mas não soube explicar.

 

Sou cidadão do mundo,

No mapa do desapego.

De um mundo sem fronteira.

Feito para quem superar o medo do desapego.

 

Circular por toda parte,

Onde vejo uma terra só,

Faz-me esquecer que a ousadia não seja um luxo só.

 

Os países, um bairro;

As cidades, diversas vilas.

Sem o burocrático passaporte,

Parece uma nova terra,

Em que a esperança se consolidou.

 

O mapa do desapego não é apego.

É desapego de um eu esquecido.

Eu contrário ao apego.

Eu que desfaz do que se considera seu.

O caminho a ser percorrido,

Do que era para o que será.

Para pessoas, cidades e países.

Como se olhasse para o mapa do planeta,

E visse um só país.

 

Tem história,

O mapa do desapego.

Começou com Abraão,

Que saiu da sua terra.

Bem longe foi,

Para o outro mundo.

Nunca visto antes.

Bem longe do seu,

Até então.

 

Na terra para aonde foi,

Lutou,

Batalhou e

Cresceu.

Venceu e venceu.

 

Quem duvidar, tem o direito de descrença.

Mas o homem foi a origem de muitas nações.

Israel,

Iraque,

Irã.

Tantas outras que, por ora, não cabem mencionar.

 

Outro mapa substitui o mapa do desapego.

Terrível mapa do apego.

Quanto apego ao mundo atual!

Quanta posse no papel,

Que contamina o eu!

 

Assim não sou cidadão do mundo.

O passaporte continua a existir.

Eu continuo egoísta.

Tudo tão distante do que se pode repartir,

Com aquele que não tem.

 

Estupidez pensar que sou cidadão do mundo.

Estupidez pensar que sou cidadão do meu País.

Talvez cidadão do meu bairro.

Da minha vila onde durmo todos os dias,

Onde as aves ultimamente não ouço cantar.

Bato a mão no peito.

Meu coração continua a bater do lado esquerdo.

Onde estará o mapa do desapego?

 

Brasília, DF, Brasil, 17 de fevereiro de 2018.

Mapa do  desapego. Poema de ‎Bomani Flávio.

 

portas abertas

Cidade com portas abertas. 

Sonhei esta manhã que todas as cidades do mundo,

De todos os continentes, credos e línguas,

Estavam com as portas abertas.

Ninguém nada entendia,

Porque não dava tempo por tamanha euforia.

 

Nada de alfândega

Para barrar negros, imigrantes latinos, gente mestiça.

Gente de outro planeta.

Gente vindo das cavernas desabitadas da lua.

Trânsito livre, pois, para todos os carros e pessoas.

Navios sem restrições.

 

Havia, enfim, celebração para comemorar o fim do passaporte.

Bem diferente do dia anterior

Em que eu dirigia em uma autoestrada,

Quando deparei-me com uma placa,

Furada ao meio por uma faca.

As setas invertidas me desorientavam.

Da esquerda direcionava para as portas brancas.

Da direita para portas pretas.

Lágrimas saíram de meus olhos.

 

Quantas classificações para processar!

Na estrada,

Seja aonde for,

As leis do trânsito não deveriam levar a lugares difíceis.

 

Acordei assustado.

Não devia haver cidade com portas brancas!

Também não devia haver cidade com portas pretas!

Bastava a denominação cidade com portas.

 

E se houvesse que qualificar as portas,

Que fosse a cidade com as portas abertas.

Cidade com portas receptivas faz bem a si mesma,

Pois a propriedade é uma fantasia de quem a criou.

Só se leva a propriedade quando se morre.

 

Brasília, 3 de dezembro de 2017 às 16:47

‎Cidade com portas abertas. Poema de Bomani Flávio.