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espólio sentimental

Espólio sentimental.

O espólio sentimental surgirá,

Se o amor não vingar.

Tão breve quanto o broto de ramo que mal cresceu,

Quem testemunhará?

 

O que comprovará a existência desse amor?

Restarão as testemunhas,

Sejam do bem,

Sejam do mal.

Entre elas, os retratos ou as fotografias.

Espólio sentimental que ficou,

De um amor que não vingou.

 

Não chore,

Não lastime,

Se o espólio sentimental foi o que restou,

De um amor que não vingou.

Poderia listar outros não,

Mas o tempo infelizmente não esperou.

 

De que adianta os retratos ou as fotografias rirem

Cliques de viagens inesquecíveis,

Abraços e beijos, alguns em público,

Evidências, pois, de uma intensa felicidade,

Se, nos dias de hoje, sobrarem apenas o resto de uma dor?

 

A felicidade pode estar nos retratos ou fotografias,

Mas a tristeza, se acolhida,

Transformar você em um ser tão abstrato,

Que xingará, a toda hora, o presente de ingrato.

Retratos ou fotografias são ideais.

 

Assim como nem toda planta vinga,

Nem todos os ideais também vingam.

Tudo parece ideal,

À primeira vista.

Tudo parecerá ideal,

Se não encher a terra,

Aquela lá dentro do ser,

Com satisfação.

Que é pois que vem?

Nada virá,

Porque tudo no passado estará.

Pilhas e pilhas de retratos.

Muitos nas nuvens,

De um amor que se foi.

 

Se os retratos ou as fotografias não encherem a terra do ser com satisfação,

Inevitavelmente aparecerá o espólio da medicação,

Com vasto acervo infelizmente da decepção.

 

Brasília, DF, Brasil, em 17 de agosto de 2018.

Espólio sentimental. Poema de Bomani Flávio.

medo da morte

Filho da puta, o medo da morte. Como superar?

Filho da puta, o medo da morte.

Estou andando há tempo sem norte.

Tenho vivido muito assustado,

Por causa do medo da morte.

Medo dessa espécie exauri a mente,

Mesmo de quem se acha forte.

 

Exaurimento que não se sabe como vem.

Se ficasse apenas no instinto,

Tudo ficaria bem.

 

Mas o medo da morte às vezes supera o instinto.

Vulnerabilidade que deixa meu ser assustado,

A ponto de me deixar extremamente desajustado.

 

Puta que, ao longo do dia, não vai fenecendo.

Apesar do assombro do medo da morte,

O que mais quero, afinal, é viver.

 

E viver e viver com intensidade,

Mesmo com a ajuda do Rivoltril.

Ansiolítico que consumo para me tranquilizar.

Então isso não pode ser apenas instinto!

 

O medo da morte é, pois, um complexo labirinto.

Mas o que será a morte para tanto medo?

Ser invisível que não se ver.

Existência que não se questiona.

A vida oferece sonhos.

A danadinha brinca de tirá-los.

 

Bem sei que não sei.

A morte é um bem,

Simplesmente um bem,

Rejeitada por cem.

Mas quando gera receita,

Quem aplaude essa tremenda filha da puta?

 

Mas o que será a morte?

Bem sei o que sei.

Melhor resposta vem do rato,

Que vira espécie de brinquedo.

Objeto que se transforma em comida.

 

A presa sabe quem é o predador.

O corpo treme.

Sente calafrios.

Fica paralisado.

O rato sabe porque sabe.

O instinto do medo.

Porém há aqueles que nada sabe.

Mas a morte é bem maior do que um gato.

Ela é do tamanho do universo.

Para matar usa qualquer artefato,

Inclusive o próprio gato.

 

Ela adora a vida no anonimato,

Mas também adora usar qualquer artefato.

Se a morte é do tamanho do universo,

Eu queria ser um multiverso.

Assim seria maior do que a morte.

Não teria medo,

Nem estalos no pescoço.

 

Andando nesta rua que ficou de repente tão solitária,

O que mais quero é viver.

 

Filho da puta, o medo da morte.

Embora pareça o maior ser do universo,

Assume a forma de qualquer objeto.

Como aquela caixa do Rivoltril,

Guardada no armário.

Se eu me livrar do ansiolítico,

E se eu conseguir,

Talvez eu deixe de ser tão raquítico.

Eu me tornaria maior do que o medo da morte?

 

 

Brasília, DF, Brasil, em 09 de agosto de 2018.

Filho da puta, o medo da morte. Como superar? Poema de Bomani Flávio.

Guerra dos oceanos. [NARRATIVA EM CONSTRUÇÃO]

Resumo sobre a narrativa: E se o Brasil fosse deslocado geograficamente para a Europa, o que aconteceria? Confira na narrativa “A Guerra dos Oceanos.”

Leia mais

cavalo negro

Um cavalo negro saiu da minha orelha.

Um imenso cavalo negro libertou-se da minha orelha,

Enquanto a terra dos meus olhos girava.

Durante o sol da lua,

Sofri, e como sofri!

 

Dor de parto que ninguém presenciou.

Mas quem iria acreditar?

Meses, anos, por quanto tempo suportei, não sei.

A dor sobrenatural, às vezes, tem começo sem término,

Quando o medo vem de um equino.

 

Minha orelha direita brotou um cavalo,

Lindo cavalo negro de raça.

Possível criação da cera do meu ouvido.

Do cerume, e que tanto cerume, pois eu não limpava!

 

Estranha escultura oriunda de uma nojenta cera,

Fabricada pelo extraordinário magma,

Que tinha lá dentro do meu querido ser.

 

Além de lindo, bicho assustador.

Olhos que eu não via.

Animal grande como um elefante.

 

Lá dentro do ser, porém, quanto aperto!

Quanta sensação de aperto para um lugar.

Tão grande como uma concha de colher.

Aquela de sopinha!

Verdade muito maior do que a denúncia de delírio,

Extremo delírio,

Da mente cansada de um pobre trabalhador,

Que pega ônibus lotado todos os dias.

 

Trajeto longo como um dia,

Para uma vida com pouca ou nenhuma ousadia.

Quantas conversas comigo mesmo,

Inclusive nesse itinerário!

E às vezes eu ouvia:

Cara estranho.

Serzinho esquizofrênico!

 

Cada modalidade de doido que surge!

Eu dormia, acordava, fechava os olhos.

Para os passageiros um louco,

Para o cavalo negro um hospedeiro,

Que seria o derradeiro.

Derradeiro com abrigo tão pequeno,

Para animal tão bruto.

Bem cuidado, pela aparência, em refinados haras.

 

Contudo, por que quis se abrigar em lugar que nada tem de aras?

Um imenso cavalo negro saiu da minha orelha.

Lindo e assustador animal,

Que saiu do meu ouvido,

Sensível ouvido de um trabalhador.

 

Como essa espécie animal entrou no meu ouvido,

Se eu me cuido o tempo todo?

Talvez tenha sido cria dos sonhos.

Desejos de uma casa boa,

Possuir carro próprio.

Dar condições dignas à família.

 

Como o bicho cresceu, não sei.

Mas eu sei que saiu.

O animal rosnou e sumiu misteriosamente,

Quem sabe seduzido por um outro abrigo,

Mais atraente do que o meu.

 

Foi-se e uma paz de espírito, lentamente, invadiu meu ser.

A habitual surdez foi embora.

Inexplicavelmente sons voltei a escutar.

Conversas comigo mesmo parei de falar.

 

Os habituais chatos do busão seguiram a longa viagem,

Sem um esquizofrênico a perturbar.

Sob o intenso sol da lua,

Um imenso cavalo negro saiu da minha orelha.

Lindo equino de raça,

Produzido pelo cerume do meu ouvido.

 

Foi-se o animal para muito longe.

Bem distante da minha orelha.

Eu nasci, cresci e envelhecendo estou,

Mas sei que tantas coisas ainda vão nascer dentro de mim.

Às vezes bicho sem pé nem cabeça.

Será que estarei pronto,

Já que não há uma escola de preparação?

 

Brasília, DF, Brasil, em 03 de agosto de 2018.

Cavalo negro saiu da minha orelha. Poema de Bomani Flávio.

mercado-do-futuro

O surgimento do mercado do futuro.

O mercado do futuro está chegando.

Cada dia crescendo e invadindo.

Crescendo no retrovisor do meu ser.

Mas no retrovisor de fora reluz outro mercado.

O mercado do presente.

 

Mercado que é intransigente.

Instrumento voraz do preço.

Mercado que oprime meu pequeno bolso,

Que tem pouco ou nenhum dinheiro.

 

Opressão onipresente.

Basta ligar o som do carro.

Tantas notícias do mercado do presente,

Que regula os preços.

Notícias e mais notícias.

 

Empresa que perde valor de mercado.

Mercado da bola que gasta milhões.

Marketing para se destacar no mercado.

Inflação acelera para 1,26%.

Mercados dentro de mercado.

Tudo gira em torno do mercado,

Que quer tirar o que não tem do meu bolso.

 

Esse é o mercado do presente,

Que se alimenta do preço.

Tudo está no preço.

O show, para ouvir, tem preço.

Carro para andar tem preço.

Para abastecer tem preço.

Tudo tem preço, que causa dor,

Dor de raiva,

Dor de fome,

Em quem pouco ou nada tem.

 

No mercado do futuro, porém,

Quem pouco ou nada tem terá um preço,

Valor que excede o monetário,

Para acabar com a dor.

A terrível dor que vem do preço.

 

A dor do preço provoca tristeza,

Em quem pouco tem ou nada tem.

Encarcera quem não tem.

O preço é mesquinho.

A culpa parece de todos.

Menos do presente.

Do mercado do presente.

 

O mercado do futuro está chegando.

Vejo a chegada no retrovisor.

Mercado que vai regular o bolso,

De quem tem pouco ou nada tem.

Vai se contrapor ao mercado do presente,

Que lista restritas riquezas como valor:

Mercadoria, serviço ou patrimônio.

 

O triplé do mercado do futuro, todavia, será o ser,

Que somente sente, neste momento, o cheiro do aborrecer.

Baba baba e pouco ou nada vê.

 

O mercado do futuro está chegando.

Para diminuir ou acabar com distâncias.

Mas, no meu ser, já chegou.

Mundo sem barreiras entre o pobre e o bolso.

Muito mais do que uma brincadeira,

De um doido qualquer.

 

Mercado do futuro e mercado do presente.

Dois mundos, duas vontades.

Tudo nasce de vontade,

Se o ser nada tem.

 

O mercado do futuro está chegando.

Só se espera que o ser não tenha preço,

Que impeça de viver uma vida melhor.

Toda transformação será boa,

Se for para o bolso de quem pouco ou nada tem.

 

Brasília, DF, Brasil, em 17 de julho de 2018.

O surgimento do mercado do futuro. Poema de Bomani Flávio.

cuidados pessoais

Dilema dos cuidados pessoais.

De cuidados e cuidados.

Eu preciso de cuidados.

De cuidados pessoais.

Zelo pela limpeza da casa.

Cuido das crianças com capricho.

 

Faço o café da manhã com primor.

Levo as crianças à escola,

Aonde vão sempre bem arrumadas.

Mas, com o tempo, percebi que desaprendi a cuidar de mim.

 

Socorro!

Socorro!

Eu preciso de cuidados.

De cuidados pessoais.

Infelizmente não estou sabendo cuidar de mim.

 

Pois o que está acontecendo comigo?

Colesterol alto que não cai.

O triglicerídeo sempre aumentando.

A pressão arterial que só se acalma com remédio.

 

Socorro!

Socorro!

Eu preciso de cuidados.

De cuidados pessoais.

Quando tento usar uma roupa mais ousada,

A barriga não cabe o vestido mais largo do guarda roupa.

A culpada sou eu, não são os doces.

 

Apesar de todas esses dilemas,

Agora chega a ansiedade.

Tão faceira quanto uma péssima conselheira,

Que chega no silêncio para debochar dos meus cuidados.

Sinto às vezes falta de ar.

A impaciência vai ao limite.

Parece que a depressão está chegando.

 

Assim, vou pirar como elefante fora da savana.

Socorro!

Socorro!

Eu preciso de cuidados.

Já as crianças serão as adultas

E eu voltarei a ser criança.

Voltarei ao colo da minha mãe,

Para reaprender a cuidar de mim.

 

Brasília, DF, Brasil, em 18 de julho de 2018.

Dilema dos cuidados pessoais. Poema de Bomani Flávio.

Desejos

Desejos escondidos sob o casaco de pele.

O mundo foi criado por desejos.

De desejos eu nasci.

Sou formado por desejos,

Criaturas visíveis e de carne e osso,

Escondidos sob o casaco de pele,

Que me cobre todos os dias.

 

A pele está por fora.

À vista dos olhos, é uma.

As criaturas estão por dentro,

Escondidas sob o casaco de pele,

Que me cobre todos os dias.

São milhares de milhares,

Encravados na terra fértil,

Extremamente fértil e oculta,

Do interior do ser do meu ser.

 

Assim, se o homem veio da terra,

Da terra também vem os desejos.

Terra fértil, bem fértil,

Onde se produzem os desejos,

Lá dentro do ser do meu ser.

 

Terra fértil, por sinal, que mal conheço.

Se fosse terra estéril,

Domaria facilmente esses bichinhos de carne e osso,

Escondidos sob o casaco de pele,

Que me cobre todos os dias.

 

Terra fértil que brota alegria.

Terra fértil que brota a tristeza.

Às vezes brotam flores de espécies estranhas,

Que exalam ansiedade sobre ansiedade.

Outras vezes exalam depressão.

Isso durante dias, semanas ou anos,

Para bagunçar o ser do meu ser.

 

São tantos desejos, milhares de milhares.

Andam por toda a parte do meu ser,

Escondidos sob o casaco da pele,

Que me cobre todos os dias.

Aquelas espécies que assustam sobremaneira o ser.

Vão e voltam,

A depender do querer,

Que muitas das vezes não controlo.

Desejos dominantes versus desejos dominados.

Que receita vou usar,

Para lidar com cada um todos os dias?

 

Talvez seja por isso que eu seja assim,

Vulnerável como uma formiga,

Com aquela imensa folha nas costas,Na calçada de tanta gente.

Bom seria que a terra fosse desértica.

Todo mundo pensaria,

Após pensar demais,

Qual caminho pegaria.

 

O mundo foi criado por desejos.

De desejos eu nasci.

Tudo nasce por causa dos desejos.

Sem desejos ninguém vive,

Nem você nasceria.

 

Desse modo, se eu errar,

Quem paga será a pele,

Não os desejos,

Criaturas visíveis e de carne e osso,

Escondidos sob o casaco da pele,

Que me cobre todos os dias.

Como domá-los?

Despertam como vulcões para bagunçar o ser do meu ser!

Vulcão ativo atormenta,

Mas muitos vulcões ativos e próximos desorientam a bússola.

Aquela que tem no ser.

 

Preciso, pois, domar os bichos selvagens,

Que assombram o ser do meu ser.

Por ora, melhor fechar os olhos por instantes.

Pensar que sou um.

Um só nome.

Uma só pessoa.

Sensação que acaba quando abro os olhos.

Os desejos são milhares de milhares.

Às vezes se comportam como anjos ou demônios,

Escondidos sob o casaco de pele,

Que me cobre todos os dias.

 

Que receita vou usar,

Para lidar com cada um todos os dias?

São milhares de milhares,

E eu apenas um.

Mas esse um tem que ser o chefe, manter-se chefe, de todos os dias.

Quanta responsabilidade para esse um!

Manter-me, a todo momento, íntegro e com sanidade!

 

Brasília, DF, Brasil, em 08 de julho de 2018.

Desejos escondidos sob o casado da pele. Poema de Bomani Flávio.

sentimento-de-culpa

O sentimento de culpa entrou pela janela.

Que sentimento de culpa é esse

Que está entrando

No interior do meu ser?

O vento diz que é a tamanha tristeza,

Estranha tristeza,

Que está a ameaçar meu ser.

Insistiu tanto que abateu meu ser,

Sem arma nenhuma para se defender.

 

Sentimento que virou uma corda.

Invisível corda.

Menos brinquedo para eu brincar.

 

Como será essa corda?

Como será esse nó?

Corda branca, azul, vermelha?

Grossa ou fina?

Peça pequena ou grande?

Nó mal feito ou bem feito?

Puta que pariu!

Basta ser uma corda,

Que machuca o ser.

 

Corda que gera uma dor de parto,

Para gerar sabe-se lá o quê.

Dor que aumenta a cada dia.

Se não aumentasse,

Ao menos eu gritaria.

 

Sentimento de culpa vagabundo!

Possibilita a satisfação dos desejos,

Por causa das inúmeras ofertas.

Mas o livre-arbítrio libera a culpa,

Que meu ser não imaginava ter.

Agora sente que virou um adulto capenga,

Que não sabe lidar com a culpa.

Se tem liberdade e é adulto, por que o sentimento de culpa?

Se a própria natureza liberou para ser um adulto,

Por que então o nó da corda no meio das entranhas?

 

Tristeza, estranha tristeza, que abate o ser.

Abate tanto que o sentimento de culpa foi crescendo, crescendo,

Até surgir um nó, nó de corda, para assustar o ser.

 

Desse jeito, como lidar com o nó nas entranhas,

Que entrou pela janela e transformou-se em corda?

Preciso descobrir como desatar esse nó.

Duas mãos, com extrema dificuldade, talvez consigam fazê-lo.

Quatros mãos podem muito mais.

Se o nó for extremamente difícil,

Uma rede de mãos pode ajudar.

 

Brasília, DF, Brasil, em 06 de julho de 2018.

Sentimento de culpa que abate o ser. Poema de Flavio di Fiorentina.